Depaisamento
(Marcus Vinicius Quiroga)
O vagão para.
Uma estranha me olha da plataforma.
O olhar parece uma pergunta que passa
pela porta.
No bolso esquerdo do blazer o coração
entreaberto.
Quantas vidas se cruzam num metrô de
outra língua?
Um carimbo no visto, espécie de licença
para existir,
me diz que não pertenço a este destino.
O instante é múltiplo.
Não cabe na blusa da mulher que me fita
sem susto,
como se já esperasse o desencontro.
Antes que a porta se feche,
salto em outro país, com um pedido de
asilo.
Me dispo da bagagem e das histórias, me
despaíso.
Solto palavras pelo piso escorregadio
da plataforma.
e elas se tornam uma frase
intraduzível.
Mas cabem no corpo que para outro
imigra.
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