quinta-feira, 31 de outubro de 2013

LARGO DA TAQUARA

(Carlos Pedala)

Quando voltamos a lugar
Que nunca vamos
Passamos por cima de anos e anos
De não voltar a esse lugar
Fomos ao Largo da Taquara
No meio de Jacarepaguá
Estava tudo mudado
Feito não lugar
O tempo poupou apenas
A Sapataria Rápido São Jorge
As lembranças que deixamos lá
Nunca mais fomos buscar... 

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

MOÇAMBIQUE

(Carlos Pedala)

Escrevo pra saber onde é Moçambique
Um lugar distante
Um lugar tão chique
Quero saber dos umbigos das moças
De Moçambique
Dos cantos dos bantos
Das ruelas e das favelas de Moçambique
Da noite da África distante
Das estrelas do céu de Moçambique
Do que falam as árvores, os campos de Moçambique
Por que choram as crianças e as mães dessa terra
E em que língua se sonha em Moçambique
Escrevo pra ver
Minha língua roçando em Moçambique... 

terça-feira, 29 de outubro de 2013

SONHADORES

(Carlos Pedala) A Fernando Pessoa

Tenho em mim todos os sonhos do mundo
E sei, por experiência, serem poucos
Jamais, contudo, devemos confundir
As coisas e os nomes das coisas
Sonhador não quer dizer ingênuo  
Quando vou à janela
Já carrego comigo o absurdo
O completo absurdo das coisas
E a futilidade do mundo
Encontrando nos sonhos o sentido
Para o absurdo da realidade
O apagar das luzes
As estrelas
Imagens do que um dia foram
Viajando pelo infinito universo
E são por essas luzes
Extintas há bilhões de anos
Que se orientam os navegantes
Mercadores de ilusão
Pelas quais sempre nos debatemos... 

DE ONDA

(Carlos Pedala) A Maya Gabeira

Se jogar assim
Em ondas
Ser tragada assim por ondas
Se afogar assim
Em meio ao mar de ondas
E morrer assim
De onda
Ser tão bela assim de onda
E viver afim de onda
E viver assim
De onda... 

TUDO PASSA

(Carlos Pedala)

O tempo de fato é elemento
Deveras estranho
Embora eterno em sua presença
Vive nos pregando peça
Faz com que cada coisa que nos apareça
Seja tragado em suas famigeradas tetas
E do mesmo modo desapareça
E a gente fica assim, às vezes, meio encucado
Mesmo sabendo isso não fazer a menor diferença
Pois o tempo continuará zombando da gente
Espelhando sua jovial eternidade
Rindo da gente, de quando em quando
Ao nos fazer ver que a única verdade verdadeiramente eterna
É que tudo passa... 

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

COMPLETA E INCERTA

(Carlos Pedala)

O café invade
O apartamento inteiro
É dentro do pulmão
À tarde
O cachorrinho sonha
Deitado em cima do sofá
Sonhos
Sopra o vento da tarde
À tarde
A tarde é aqui por perto
Raios de sol entram pela janela da sala
Iluminando a sala
E um pouquinho de quê ilumina a tarde
E a tarde é completa e incerta... 

ESTRANHAMENTE

(Carlos Pedala)

Já sei da poesia feita assim
Somente de palavras
Mas quanta coisa cabe em uma pessoa
Diluída em pensamento
Armazenada também nas palavras
São coisas tão difíceis de responder
Veja manhãs nubladas
Onde nem cantam passarinhos
Enganados por nuvens
Pelo tempo que não acontece
Quando exatamente tinha que acontecer
Há horas da vida ser assim
Estranhamente... 

LÁ FORA

(Carlos Pedala)

Acordo de madrugada
Ao chegar à sala
Deparo-me com a cena
A poltrona assistindo TV desligada
Abro as janelas
O filhote de star for shire bull terrier
Olha-me assustado
Nunca havia pensado sobre isso:
Sofás não se cansam de assistir TV desligada
O vento balança as folhas das plantas sobre os móveis
Uma epifania talvez viesse a calhar
Mas há apenas o barulho do ventilador
E dos ônibus passando lá fora... 


domingo, 27 de outubro de 2013

FILA DO SUPERMERCADO

(Carlos Pedala)

O vento derruba as coisas
Dentro de casa
E ameaça a estabilidade
O tênue equilíbrio da vida
Os quadros pulam das paredes
E o santo de gesso perde a cabeça
É óbvio
Há mistérios
Intervalos entre palavras
E nem somos assim tão novos
Para já não ter visto dessas coisas
Há quem não acredite em nada
Apenas em átomos e moléculas
Mas a gente não se lembra de ter
Encontrado um neutrino
Nem por acaso em uma fila do supermercado... 

Chacina

(Carlos Pedala)

Mais uma chacina enche a alma de sangue
Com seu gosto doce e esquisito de sangue
Mais algumas palavras toscas e frescas
Em suas insignificâncias
Mais uma nada a dizer sobre essas coisas
Incivilizadas
Violência bruta
Como se houvesse outra
Menos tosca
Menos palavras toscas
Às pessoas mortas
Nada mais interessa
Nada
E o que agora resta
Resta apenas o silêncio
Dentro daquelas bocas
Mortas
E nem mais uma palavra brusca
Dentro daquelas bocas mortas
E o silêncio que a todos nos cerca... 

Caroço

(Carlos Pedala)

Atravesso a Rua do Catete
Enquanto a chuva não decide
Incidir na Cidade
Em passos determinados
Vou à pé ao Palácio
Encontrar-me com livros
Objetos e sujeitos
Leio N’Goma de Craveirinha
A África em poesia
Onde tomo conhecimento
Da fruta mampsincha
E da gula do neguinho
De mãos de ébano
Do seu caroço... 

sábado, 26 de outubro de 2013

Completo de adjetivos

(Carlos Pedala)

Nem a gente se importa
Muito com essas coisas
Embora saibamos:
É de dentro do silêncio
Que vêm as palavras
Enigmáticas de natureza
Podemos passar bem
Sem levarmos por aí
Tais pensamentos
Como aquele cidadão
Atravessando a rua no sinal
Ao aquele outro varrendo
A calçada, nesse sábado
Completo de adjetivos... 

Cretinos

(Carlos Pedala)


Os cretinos estão por toda a parte
Inseridos na sociedade
Embora a palavra assuma conotações
Diversas de seu sentido original
O cretinismo é uma doença
É atribuída a deficiência da glândula tireoide
Pode ser também a falta de diagnóstico correto
Tais doentes são bem aproveitados pelas instituições
Chegando em algumas delas a assumir posições
Importantes
Os ditadores são um exemplo clássico
Embora em maior número e com menos destaque
Estejam sendo aproveitados em todas
Assim, não é incomum a constatação
Dita em voz baixa nos corredores:
- trata-se de um cretino!
O pior é que esse fato
Não escapa a sua estupidez
Geralmente, sabem que é deles que estamos tratando...  

Alegria e cheiros

(Carlos Pedala)


Os filhotinhos de cachorro
Acordam sempre bem dispostos
São fáceis de serem amados
Pedem bem pouco
Em troca de um afeto incondicional
Mexem em tudo
E ficam rondando nossos pés
Respondem a qualquer afago
Correm pela sala
Em brincadeiras imaginárias
Impregnam os móveis,
As cortinas, as paredes
Com sua alegria e seus cheiros...  

Diagnóstico

(Carlos Pedala)

O melhor é não falarmos
Sobre certas doenças
De alguma forma
Elas são transmissíveis
(ou parecem ser)
Através da fala
Assim, o silêncio é o melhor remédio
Vamos fingir que elas não existem
Talvez ninguém repare
Sem diagnóstico preciso
O mal é passageiro
Como tudo na vida
Inclusive a própria vida... 

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

TARDE NUBLADA

Tarde nublada
(Carlos Pedala)

Tarde nublada
Falta água na Cidade
Falta um algo de nada
Encontro o Pão-de-Açúcar  
Encoberto
Aviões em rotas diversas
Com medo da pedra e do concreto
Em meio à névoa
Em meio às nuvens
E algum receio
Resta respirar fundo
Romper a gravidade
Ver as aeronaves decolarem
Imaginar a pedra
As depressões da pedra
E fugir do seu alcance... 

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

ENCONTRO INEVITÁVEL

Encontro inevitável
(Carlos Pedala)

Para fazer parte do mundo
De dentro do atual sistema
Terei que vender minh’alma
Em troca de alguns trocados
E aprender bem apressado
A ter um pouco mais de calma

Para fazer parte do mundo
Destruirei meu presente
O instante onde vivo agora
Em troca de um futuro
Que não sei se se demora
E viverei em cima do muro

Para fazer parte do mundo
Comprarei a vida a prazo
Devendo orgulhoso do passado
Economizar o máximo possível
Evitando inteligentemente a morte
Sabendo do encontro inevitável...

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

COLHEITA

Colheita
(Carlos Pedala)

Se disseres coisa
Inteligente
Vai aparecer poesia
Pois a poesia é inteligente
Para gostar de poesia
Precisamos de gente inteligente
Sendo inteligente
Será poesia
Inteligente é escolher ler
Faça a sua escolha
E colha... 

DINHEIRO

Um dinheiro
(Carlos Pedala)

Ah, eu quero um dinheiro
É aquilo que mais quero
Porque pode comprar supérfluos
Sei que o mais importante
Já tenho de graça
Por isso mesmo o que quero
O que mais quero é dinheiro
O que importa, o que realmente
Importa, já tenho de graça
Mas o supérfluo, o secundário
Aquilo que não faz muita diferença
Eu só consigo com dinheiro
Por isso o que mais quero é dinheiro
Aliás, eu só quero um dinheiro
Pois o importante mesmo
Eu já tenho... 

terça-feira, 22 de outubro de 2013

BARULHOS

Barulhos
(Carlos Pedala)

A casa se fez em silêncio
E cada ruído é ouvido
Como se nunca houvesse existido 
Nem em pensamento
Abrir e fechar portas
Lavar copos e louças  
O espirro, a tosse, o pigarro
Afora os sons vindos da rua
Quase são ofensas
As sombras estão distribuídas
A gota de sono espremida
Pena ser o mundo de fazer barulhos... 

RÁPIDO DEMAIS

Rápido demais
(Carlos Pedala)

Vou até à janela
Espero pelo dia
Mas ele não vem

Apenas um carro em disparada
E a luz vermelha em cima do prédio
Resolvo fazer um café

De relance
Vejo um desconhecido no espelho da sala
Volto, ele parece querer me dizer algo
Alguma coisa
Talvez sobre o tempo
E de como ele passou rápido demais... 

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

DAQUELE JEITO

Daquele jeito
(Carlos Pedala)

O vento derrubou as folhas
Das palmeiras da Rua Paissandu
As portas ficaram batendo
Com medo da fúria do vento
Mais tarde ou mais cedo
No meio da madrugada
O caminhão do barulho
Tão fanfarão como o vento
Não dá para dormir direito
Pois já faz calor intenso
O ventilador e o ar condicionado
Também são barulhentos
Passaremos o dia daquele jeito... 

ÍNDIOS

Índios
(Carlos Pedala)

Os índios Yanomamis
Pensam que pertencemos à Terra
E não o contrário
Para eles tudo é humano
Eles acham que os homens brancos
Ou seja,
A civilização moderna
É confusa
Talvez mesmo perdida
De si mesma
Vive numa busca desfreada
Deixa de desfrutar da vida
Em troca de uma ilusão... 

O ESPERAR

O esperar
(Carlos Pedala)

O que foi escrito
Saiu da ponta dos dedos
Da pressão deles nos teclados
Das coisas da vida
Também de dentro da barriga
Vindo lá do interior

Veio das vidraças
Do abrir e fechar das portas
De dentro do ser dos silêncios
Carregado na voz dos amigos
Do que foi lido
Esquecido e Lembrando
Vindo lá do passado

Veio de certo olhar
Saiu da escuridão
E do luar
Do vagar de nuvens
Na fixação do passar
Do esperar o ônibus quatrocentos e dez
Que às vezes demora muito a chegar... 

domingo, 20 de outubro de 2013

SOB ESSE OLHAR

Sob esse olhar 
(Carlos Pedala)

Esse olhar de novo
Feito o dia novo
Logo de manhã
Ele é tão bonito
Vem do infinito
Esse olhar de novo
Sob esse olhar
Sinto o mundo lindo
É feito promessa
Onde se deitar
Sou a liberdade
Ao me aprisionar
Sob esse olhar
Tal olhar desperta
Feito musa
A alma de poeta
Quero esse sorriso
A brilhar no mundo
E a dizer a todos
De forma tão simples
Do bem viver
Sob esse olhar...    

YANOMAMI

Yanomami
(Carlos Pedala)

Dorme agora
É só o vento lá fora
E a culpa de tudo o que aconteceu
É minha
Deixe o tempo
Tempo venha
É tudo culpa minha
A vida não é o que sonhamos
Talvez tenhamos de ir
A uma aldeia de índios Yanomami
Para saber que somos

Apenas aquilo que somos... 

sábado, 19 de outubro de 2013

A DOR DE MIM

A dor de mim
(Carlos Pedala)

Ao cair da tarde
O mundo entristeceu
Sem o mínimo porquê
O futuro ruiu
E aconteceu
O que tinha que acontecer

Ao cair da tarde
O tempo passou
E a alegria findou
Porque tinha que ser
O que tinha que ser
E o ser de mim sou eu

Ao cair da tarde
O azul do céu escureceu
Brilhou a escuridão
A dor venceu
Porque tinha de vencer
E a dor de mim sou eu... 

ARTE DA POESIA

Arte da poesia
(Walter Januário e Carlos Pedala)

A poesia é a mãe de todas as artes
É de linguagem
A poesia é língua
É língua na língua
É beijo de língua na arte
A poesia é política pura
É espirito limpo
É a alma translúcida
É justificativa
É tristeza e alegria
É o silêncio na multidão
Poesia é tudo que se queria
É nada que não se poderia... 

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

NO ESCURO

No escuro
(Carlos Pedala)

É dor que existe em si
É dor que dura
Viver em quarto escuro
É viver
É mais onde se procura
Onde há nuvem de fumaça
Escura
É dor que dura
Vou me perder
Até encontra o modo  
De te dizer da cura
Já não posso prometer
Ser o não-ser
É dor que dura
É duro ver você aprender
No escuro... 

DE NOVO HOUVESSE

De novo houvesse
(Carlos Pedala)

Houvesse poema
Pra curar dor de existir
Ou palavra-chave
Houvesse apenas chuva
E água corrente em ser
Pra que você houvesse
Apenas em ser
Houvesse sorriso
De bem-viver de novo
E alegria houvesse de novo... 

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

DOCE BALANÇAR

Doce balançar
(Carlos Pedala)

Minha rua tem palmeiras
Onde o Sol há de brilhar
As aves que aqui gorjeiam
Nasceram dentro de gaiolas

Minha rua tem palmeiras
Quando uma delas morre
Outra é replantada no lugar
Logo umas são maiores que outras

Minha rua tem palmeiras
Mal consigo ver o azul do céu
Mas consigo imaginar o luar
Já na Praia do Flamengo não há mar

Minha rua tem palmeiras
Quando ando por entre elas
Tenho medo dos assaltos
E aprecio o seu doce balançar... 

DE DENTRO

De dentro
(Carlos Pedala)

Mais uma manhã se fia
Pássaros ensaiam o canto
Alguém chama na portaria
De dentro do grito o espanto
Por um momento o silêncio

Mais uma manhã se fia
Ao abrir as janelas os cheiros
Adentram o apartamento
De dentro pra fora pra dentro
Um encontro de alegria

Mais uma manhã se fia
Enquanto vivo o momento  
Vai nascendo aqui na tela
De dentro dessa cachola
Mais uma manhã de poesia... 

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

DA RUA PAISSANDU

Da Rua Paissandu
(Carlos Pedala)

Deixo a janela aberta
Escuto a chuva
Os pneus dos carros
Cortando a chuva
Algum outro carro buzina
Outro alguém do outro lado
No prédio em frente se levanta
Vai até a sacada
Dá uma espiada
Volta a sentar-se em frente à TV
Escuto a chuva
Os sons do piano que vêm do quarto
Do seu modo,
Tudo parece estar
Exatamente onde deveria estar
O carro se aproxima com som alto
Perturba o ambiente
Logo a seguir a moto
Com exceções pontuais
Escuta a chuva, o piano
E um barulho ou outro
Da Rua Paissandu... 

ENQUANTO CHUVA

Enquanto chuva
(Carlos Pedala)

Enquanto cai a chuva
Espero a hora de ir
Buscar meu filho
Na escola de piano

Enquanto cai a chuva
Espero a hora passar
A folha da palmeira
Balança suspensa no ar

Enquanto cai a chuva
Espero a tarde passar
E há alguns pingos
Agarrados nas vidraças

Enquanto cai a chuva
Meu pensamento dança
Para o lado de lá e para cá
Enquanto a chuva não parar... 

CHOVE SEM PARAR

Chove sem parar
(Carlos Pedala) A Jorge Bem Jor

Pra dizer da chuva
Pra dizer dessas coisas
Dessas coisas de chuva
Do frescor da chuva
Do ar gelado da janela
Pra dizer dessas coisas
A maneira correta da chuva
A fórmula completa da chuva
Protegidos da chuva
As janelas abertas da chuva
O cheiro da chuva
As palmeiras molhadas da chuva
A preguiça do dia de chuva
Não precisar sair na chuva
Escutar a chuva caindo
A chuva batendo no telhado
Os dias de chuva e chuva
O tédio da chuva
As nuvens de chuva
A delícia da gente na chuva
Chove chuva
Chove sem parar...


terça-feira, 15 de outubro de 2013

POEMA MALCRIADO

Poema malcriado
(Sylvia Ripper)

Um poema desandou
do lado esquerdo do sofá
tropeçou no abajur
quebrou o jogo de chá

Pendurou-se nas cortinas
da sala de jantar
derrubou a cristaleira
do bisavô Valdemar

Escorregou na cera
do chão da sala de estar
esqueceu a chave na porta
que o vento fez trancar

Agora ficou o poema
preso  fora no jardim
e branco, livre e desatinado
chutou seu último verso
e acabou sem fim.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

POEMAS PERDIDOS

Poemas perdidos
(Carlos Pedala) Para Sylvia Ripper

Coitado do poema acuado
Mal nasceu foi derramado
Mas eis que isso é a vida
A um faz rei mandante
De capa de ouro comprida  
Ao outro poeta errante
No máximo cibernético escriba
Mas mesmo acuado num canto
Com medo de sinteco encerado
Esse poema há de ser lido
Um dia ele há de ser resgatado
Por poetas cuja missão no mundo
É encontrar poemas perdidos... 

POEMA DERRAMADO

Poema derramado
(Sylvia Ripper)

Derramei um poema
por um descuido
transbordado
escorreu pelo chão
mas não esparramou
ficou ali, acuado
tem poema que morre de medo
de andar em sinteco encerado.

DIGO SIM

Digo sim
(Estela Menezes)

Um livro
De verdade
Na verdade
Guarda melhor os versos
Que um ipad, um ipod
Ai que merda
Quando caem
Soltam tudo
Pelo chão
Não quero ter
Que varrer
Ou pisar versos.

POEMA VARRIDO

Poema varrido
(Carlos Pedala) Para Estela Menezes

Por mais que você tenha zelo
E mantenha-os guardados
Tudo o que escreve
Será lido
Sei que o poema foi feito para isso
Para ser lido e relido
Mas mesmo assim
Há uma parte dele que escapa
Que foge entre os dedos
E não adianta lamentar o poema derramado
Seja em livro
Seja em meio digitado
Porém, pisa neles devagar
E ao varrê-los
Faça-o com cuidado
Pois o poema varrido
É pior que ex-marido...